As empresas de tecnologia e SaaS gostam de dizer que são focadas no cliente e que seus produtos ou serviços são pensados para que o usuário tenha a melhor experiência. Porém, na prática, o profissional de CX, aquele focado na cultura do cliente e responsável por gerenciar e aprimorar a interação entre cliente e a empresa, geralmente, é um analista (31%), ou seja, sua formação é ainda inicial. Para completar, esse profissional está sedento por capacitação, mas é ele e não a empresa para a qual trabalha que tira do bolso o dinheiro para fazer cursos. Os dados são da pesquisa Customer Insights 2024 e extraídos da plataforma Consumer Insights, da MindMiners, em parceria com Sensedata, CS Academy e Zenvia. O objetivo do estudo é fazer uma análise entre as relações de empresas e clientes, identificando as necessidades atuais e projetando as do futuro. O estudo aponta desafios, percepções e rotinas dos profissionais que atuam com clientes, inclusive de áreas como Customer Success e Customer Experience.

Metodologia

A pesquisa ouviu 259 respondentes entre novembro e dezembro de 2023, a maioria composta por CEOs, com modelo de negócios SaaS e da região Sul e Sudeste do País, e de diferentes tamanhos – sendo 44% localizados em São Paulo e 12% em Santa Catarina. O número de colaboradores das empresas varia entre até 100 pessoas (48%) e até 3 mil pessoas (5%).

Apagar incêndios e falta de foco para estratégia

Customer Insights 2024

Tela extraída do estudo Customer Insights 2024. Imagem: divulgação

A organização das empresas mostra também que o foco não está na elaboração de uma estratégia para a área, mas, em muitos casos, o tempo está reservado para apagar incêndios. A pesquisa, por exemplo, aponta que os rituais internos das empresas focam no dia a dia. Considerando que há mais de uma opção, mais de 60% fazem reuniões de alinhamentos semanais; mais de 50% procuram fazer reuniões 1:1 de desenvolvimento e aproximadamente 50% fazem reuniões de apresentação de resultados para a liderança; 30% fazem agendas diárias de alinhamento e priorização ou agendas de planejamento mensais e, por fim, somente 10% fazem agenda de status de carteira.

“A gente percebe que os rituais são mais táticos e operacionais e, consequentemente, o resultado é menor. A falta de maturidade do líder, do gestor, para tocar a operação é visível na pesquisa. O perfil dessas empresas é de baixo investimento na equipe de CS/CX. Resumindo: o líder é júnior, não toca a parte estratégica, não participa do planejamento, então, ele acaba ficando na parte operacional. A consequência é um LTV ((lifetime value, ou valor de tempo de vida, em português) menor”, aponta Diego Azevedo, fundador e CEO da CS Academy.

“Tem muito pouco volume de reuniões executivas e muita reunião online, provavelmente, tocando o dia a dia”, diz Bruno Dias, gerente de sucesso do cliente da Zenvia.

Outra característica que “assusta” os porta-vozes da pesquisa é que “somente 50%” treina o cliente e faz o kick off de projetos, iniciativas mais estratégicas. “E, mesmo com tudo isso, o sentimento é que a empresa é centrada no cliente, mas, na realidade, no dia a dia a gente não vê isso”, completa Azevedo.

Dias também sinaliza um outro dado que corrobora que essas empresas não estão focadas no cliente: 37% não possuem recorrência definida de contato com o cliente.

“O time que está preocupado em apagar incêndio, acaba não tendo como pensar na estratégia, de reduzir o churn. Não dá tempo de fazer um trabalho estratégico para manter o cliente engajado e melhorar os indicadores”, completa Azevedo.

A pesquisa também mostra quais são os principais desafios dos clientes. Entre eles está o valor elevado em relação à concorrência e, na sequência, a alta complexidade para utilizar o produto/serviço. Na terceira posição, tempo de espera elevado no atendimento e, na quarta, mau funcionamento do produto.

“Os problemas estão mais concentrados nos desafios de uso do produto. Talvez uma boa estratégia é procurar indicadores que sinalizem mau funcionamento, falha de entrega”, por exemplo, sugere Dias.

Canais de atendimento

Customer Insights 2024

Tela extraída do estudo Customer Insights 2024. imagem: divulgação

Entre os canais de atendimento entre empresa e cliente estão na liderança o e-mail e o WhatsApp, ambos com mais de 87% da preferência. Em seguida, estão as reuniões online (71%). O destaque aqui é que somente 6% fazem encontros presenciais.

“Nesse indicador vemos que está muito no operacional, com trocas assíncronas de email e WhatsApp, focado no dia a dia, e baixo volume de reuniões online – que seriam mais estratégicas e serviriam para aprofundar a discussão”, explica Dias.

Cultura da empresa e ferramentas usadas

70% dos respondentes acreditam trabalhar em uma empresa que promove a cultura do foco no cliente. 54% acreditam que existe espaço para evoluir e 26% afirmam que a empresa possui uma cultura pouco centrada no cliente.

Entre as ferramentas de atendimento, as empresas usam a solução da Zendesk, seguida por email e, em terceiro, a plataforma da Movidesk.

Já para gestão de clientes, 39% usam CRM; 23%, Sensedata; e 17% não usam ferramenta específica, somente Excel.

Tanto Dias quanto Azevedo alertam que é importante que as empresas tenham consciência de usar a tecnologia adequada para cada fim. O CRM, por exemplo, é a primeira do ranking de gestão, porém, não é a plataforma mais funcional para a criação de controle e jornada do cliente no pós-venda.

Acompanhamento de resultados

Entre os indicadores mais usados por essas empresas para monitorar os resultados, o NPS é o principal (33%), seguido de Customer Satisfaction (20%) e Net Churn/MRR Churn (20%), que são pesquisas de atendimento, de satisfação ou de indicação do nível de fidelidade. Há ainda health score (14%) e receita de upsell e cross-sell (13%).

“É alarmante que a receita tenha um percentual tão baixo, sabendo que, no fim do dia, ela deveria ser o principal indicador”, lamenta Dias.

“Ouvir o cliente é importante, claro, mas não resolve tudo e descola a responsabilidade principal, que é a receita”, afirma Azevedo. “Não acompanha o engajamento do cliente, a saúde do cliente e os dados e as métricas financeiras, que vão realmente mudar a área de um patamar de custo para uma de geração de receita da companhia”, resume Azevedo.

Ao avaliar o LTV médio, a maioria das empresas ficou entre um e dois anos (27%), um tempo que os analistas avaliam como relativamente curto. E poucos relacionamentos de mais de 48 meses (15%). O positivo é que há uma baixa quantidade de seis meses (7%). “O principal ponto aqui é que, quanto melhor o relacionamento, quanto mais profundo ele for com o cliente, maior será o LTV”, comenta Dias.

Churn e MRR

Customer Insights 2024

Tela extraída do estudo Customer Insights 2024. Imagem: divulgação

A desistência do cliente em usar o produto ou o serviço da empresa também foi medida na pesquisa. E o mais alarmante, segundo os analistas, é que 32% dos respondentes não sabem qual a taxa de churn da empresa. 20% afirmaram que é entre 2% e 4% e 16% afirmaram ser de 1% a 2%.

Já a taxa de MRR Churn, 42% dos respondentes não sabem. Vale dizer que o indicador calcula o valor “perdido” em função da desistência de clientes.