Na noite da última quinta-feira, 28, o deputado Orlando Silva (PCdoB/SP) entregou no Congresso Nacional, para votação, o relatório final revisado do PL 2630, o chamado PL das Fake News. A reportagem de Mobile Time teve acesso ao texto que, entre outros pontos, prevê de um a cinco anos de reclusão e multa para quem usar contas automatizadas para disparo em massa de mensagens com conteúdo ilegal ou falso, capazes de colocar em risco a vida, a integridade física e mental, a segurança das pessoas, e a higidez do processo eleitoral.

O relatório limita o encaminhamento de mensagens por aplicativos de mensageria, como WhatsApp. As plataformas terão que impedir que usuários sejam incluídos em grupos ou listas sem autorização prévia. Os bots também ficarão mais restritos e só poderão funcionar se forem identificados como tais. Os conteúdos publicitários deverão ser, todos, identificados pelos provedores.

Telegram

De acordo com o artigo 35 do PL das Fake News, todos os provedores deverão nomear representantes legais no Brasil, disponibilizando informações sobre eles. Este é um ponto que colocaria em risco a existência do Telegram, por exemplo, que não tem nenhum contato no País – e sequer responde a convocações de autoridades brasileiras. Entretanto, de acordo com a leitura de Flavia Lefèvre, advogada especializada em direito digital e do consumidor, representante do coletivo Intervozes e da Coalizão Direitos na Rede, o aplicativo é uma organização sem fins lucrativos, portanto não se enquadraria na lei, que, no artigo 2, diz:

“Art. 2o Esta Lei se aplica a provedores de redes sociais, ferramentas de busca e de mensageria instantânea constituídos na forma de pessoa jurídica, que ofertem serviços ao público brasileiro e exerçam atividade de forma organizada, profissionalmente e com fins econômicos, cujo número de usuários registrados no país seja superior a 2.000.000 (dois milhões) de usuários registrados, incluindo provedores cujas atividades sejam realizadas por pessoa jurídica sediada no exterior”.

Segundo Lefevre, contudo, “ainda que haja provedores de aplicação que não se encaixem no artigo 2, se um usuário tiver uma conduta que se enquadre como criminosa, vai para a prisão. Ou seja: se houver disparo em massa ilegal pelo Telegram, será crime do mesmo jeito”.

Para Christian Perrone, coordenador da área de direito e tecnologia, Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS Rio), “o requisito de representação legal no País pode dificultar que atores menores e startups possam atuar no mercado nacional”.

Rastreamento

Um ponto polêmico do relatório, que chamou a atenção de especialistas e entidades ligadas ao setor, foi o que dizia respeito ao rastreamento das mensagens. A proposta inicial determinava o rastreamento e o armazenamento por três meses dos dados dos usuários  que encaminhassem mensagens para mais de cinco pessoas. A rastreabilidade foi retirada do texto, pois pressupunha o uso de dados pessoais e colocava em risco a criptografia, o que poderia gerar vigilância em massa.

Porém, segundo Perrone, ainda há a obrigação das empresas guardarem informações sobre as interações das pessoas. “Isso de certa forma torna necessária a continuidade de uma coleta extensa de informações por parte das plataformas”, apontou. Um trecho do projeto, por exemplo, diz:

  • 3º Havendo dano individual ou difuso a direito fundamental, a autoridade judicial poderá determinar aos provedores de aplicações a garantia do direito à informação e à reparação, que consistirá no envio de informações factuais e determinadas a todos os afetados pelo conteúdo que viole os termos desta Lei ou os termos de uso dos provedores, na mesma medida e alcance do conteúdo considerado inadequado.

Relatórios e autorregulação

O Projeto de Lei prevê que os provedores devem produzir relatórios trimestrais de transparência e disponibilizá-los em seus sites. Eles também devem elaborar suas próprias regras – desde que respeitem a legislação nacional. “A ideia de autorregulação regulada é boa, mas tem uma série de dificuldades. Talvez a maior delas é que a construção dos parâmetros não é feita de maneira concertada e coletiva”, criticou Perrone.

O CGI.br (Comitê Gestor da Internet no Brasil) foi designado para acompanhar as medidas da lei, formando uma câmara multissetorial, composta por 17 membros, com mandato de 2 anos.

“A proposta que aqui analisamos é essencial para delimitar, de maneira precisa e efetiva, regras e princípios fundamentais para o tratamento das notícias falsas e da desinformação no âmbito da rede mundial de computadores no Brasil, resguardando os direitos fundamentais constitucionais e contribuindo para que a interação social no ambiente virtual seja mais civilizada e serena”, defendeu, por fim, o relator, Orlando Silva, em seu voto.