Bots

Na última terça-feira, 5, o presidente Jair Bolsonaro assinou o decreto nº 11034, que regulamenta a lei nº 8078, que estabelece diretrizes e normas sobre o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) de serviços regulados (telefonia, luz, água etc). O texto em si não aborda diretamente atendimento digital, virtual ou por meio de bots. Mas desobriga o atendimento humano 24h/7, determinado no capítulo segundo, no artigo 5º, parágrafo I: “horário de atendimento não inferior a oito horas diárias, com disponibilização de atendimento por humano”.

Sinch

Daniel Schwebel, líder de vendas da Sinch. Foto: divulgação

Para Daniel Shwebel, líder de vendas da Sinch, a mudança vai favorecer o atendimento digital, que poderá  funcionar fora dos horários comerciais. “As empresas eram obrigadas a ter 24h de atendimento telefônico humano. Agora, são 8 horas e entendo que é no horário comercial (o decreto não detalha). Ao ser contactada, a empresa pode indicar para o cliente qual canal para se comunicar fora desse horário. Tem um ganho superimportante e busca novas metodologias de SAC. Podemos colocar, por exemplo, SAC 100% via bot no fim de semana e reduzir os custos das empresas”.

O executivo da Sinch lembra também que o robô vai dar mais celeridade ao atendimento. “O bot não tem restrição de quantidade de pessoas que ele pode atender ao mesmo tempo, tornando o processo mais ágil. É possível aproveitar ao máximo o seu tempo”.

Marcelo Hein, CSO da Take Blip, acredita que o decreto chega para modernizar o atendimento ao cliente.

“O decreto vem para garantir aos consumidores de terem um atendimento mínimo e serem bem tratados. E a alteração vem para seguir uma trajetória inexorável que é o fato de que as pessoas passaram a estar em canais virtuais e as marcas também foram para lá. E já que é uma realidade – que as marcas passaram a atender em canais digitais, vamos regular isso. A regulação que protege o consumidor é sempre positiva. O regulador intervém para garantir um atendimento mínimo. E sai de uma estrutura que limitava a um atendimento telefônico e a expande”, diz o executivo da Take Blip.

Marcelo Hein, CSO da Take Blip

Marcelo Hein, CSO da Take Blip. Foto: divulgação

O decreto também determina que cada órgão regulador faça adequações às particularidades do seu setor quanto ao horário de atendimento, tempo máximo de espera (para contato direto com o atendente e transferência para o setor competente para atendimento definitivo da demanda, por exemplo). E, em seu parágrafo único: “Os órgãos ou as entidades reguladoras competentes poderão estabelecer, para o setor regulado, horário de atendimento telefônico por humano superior ao previsto no inciso I do caput.”

Para a advogada Patrícia Peck, CEO e fundadora do escritório Peck Advogados, essa é a “grande” inovação do decreto e é muito positivo para o consumidor.

Hein e Shwebel também enxergam a participação de órgãos reguladores e entidades bastante positivo.

Já Flavia Lefèvre, advogada especializada em direito digital e do consumidor, representante do coletivo Intervozes e da Coalizão Direitos na Rede, aponta para o fato de que em seu parágrafo único, o novo decreto salienta que os órgãos ou as entidades reguladoras deverão considerar o porte do fornecedor do serviço ou do produto regulado. Ou seja, as agências reguladoras podem estabelecer uma assimetria regulatória com base no porte das empresas. Para a advogada, é preciso ter cuidado com esse aspecto.

“É lógico que não podemos comparar o mercado da esquina com um grande supermercado ou um pequeno de um grande provedor de Internet. Existem diferenças. Mas quando levamos em conta determinados direitos – e vou dar um exemplo da proteção de dados pessoais –, a gente não pode abrir mão das regras independentemente do porte. Ele terá que tomar os mesmos cuidados para garantir a segurança dos dados; estará submetido às mesmas regras de transferência dos dados; às regras de consentimento para a transferência de dados; e deverá dar utilidades diversas para as quais o dado foi coletado inicialmente. Na regulação assimétrica não podemos nos descuidar daquilo que é principiológico, básico e direitos fundamentais. Teremos que ficar de olho nisso”, completa.

Patricia Peck também levantou outro ponto, quanto ao art. 4º, §4º, que estabelece que o acesso inicial ao atendente não será condicionado ao fornecimento prévio de dados pelo consumidor, o que, para a advogada “tende a facilitar o acesso ao atendimento humano, cada vez mais difícil no emaranhado de opções apresentadas pelo suporte eletrônico.”

Patrícia Peck

A Advogada Patrícia Peck. Foto: divulgação

“O que muda de principal (ou que deve mudar) é a URA não condicionar o fornecimento de informação prévia antes da transferência e, mais importante, ter-se destacado princípios de atendimento, não explícitos no decreto 6523/08 (de 2008)”, completa.

Shwebel lembra também que o bot ainda é pouco usado como canal de atendimento ao consumidor e muito mais explorado para vendas. Para o executivo da Sinch, o decreto vai estimular a abertura de novas possibilidades para o robô. “Algumas empresas já usam esses canais , mas com foco comercial. Algumas verticais possuem chatbot para SAC, como os laboratórios – com linha de atendimento ao cliente, exames, consultas, relatórios. Existe um movimento, mas poucas empresas prestam serviço de atendimento ao consumidor via essas plataformas. Vai abrir um leque inovador da parte de SAC que a gente até então não via”.