A falta de mão de obra e a dificuldade em obter investimentos são os principais entraves para indústria nacional inovar, ao lado de outros obstáculos, como juros alto para acesso ao crédito e a baixa produtividade ante China e Estados Unidos. É o que apontaram os representantes dos setores de máquinas, químicas, alimentos e autopeças em evento organizado pelo MetaIndústria na última semana.
Veja abaixo os principais pontos trazidos por representantes de cada setor produtivo.
Máquinas e equipamentos
A gerente divisional de tecnologia da Abimaq, Anita Dedding, afirmou que há uma dificuldade das suas 9 mil empresas associadas em encontrar mão de obra que queira trabalhar em fábrica. Para atrair esse público, a indústria “precisa mostrar a sua cara” e mostrar que há potencial e uso de tecnologia pesada na indústria nacional.
Por outro lado, a executiva reforçou que o segmento como um todo tem dificuldade em definir o conceito de inovação: “Quando eles trazem, por exemplo, um projeto de inovação para nós, precisamos fazer uma imersão na empresa, descobrir uma cesta de projetos dentro dela para que a gente possa efetivamente identificar algum de impacto. E quando a gente transborda o nosso ambiente para empresa, temos os riscos, ao mesmo tempo em que somos cobrados para escalar”, explicou, lembrando que cada indústria tem um grau diferente de inovação.
Outro entrave que vê é o baixo investimento, uma vez que a indústria aporta apenas 1,1% do seu faturamento bruto em inovação. Uma pesquisa interna com seus associados revelou que 50% têm um parque defasado com mais de 15 anos de idade.
Alimentação
Para Cleber Sabonaro, economista sênior da ABIA, a produtividade é o principal desafio das 41 empresas do setor. Mesmo com o Brasil sendo o maior exportador em volume, o executivo afirmou que é o quinto em valor gerado, sendo que apenas os EUA produzem 50% mais em valor com 30% menos volume. Disse ainda que a produção física segue na mesma proporção da mão de obra, algo que não é ruim, mas insuficiente.
“Nós precisamos inovar mais e melhor. Então o ciclo da inovação no nosso setor é fundamental porque o mercado de trabalho caminha para uma taxa decrescente de desemprego em um patamar mais preocupante. Várias empresas têm dificuldade de contratação, isso não é novidade para ninguém”, disse. “Por outro lado, nós temos um desafio fundamental de fazer a transição para sistemas de automação digitalizados, integrando a IA generativa e IA a física”, completou ao explicar que precisam aplicar as tecnologias para desafio da rastreabilidade na cadeia produtiva, por exemplo.
Também afirmou que os juros altos seguram vários projetos de investimento e inovação no setor.
“O nosso desafio são os juros altos. Sim, nós temos linhas de financiamento, mas os juros seguram vários projetos em várias instâncias. Mas isso não tem impedido o crescimento. O que nós pedimos é que a economia brasileira se estabilize em um patamar menor de juros. Com isso, o fluxo de investimentos tende a crescer”, disse.
Química
Com o Brasil como a sexta maior indústria química do mundo e um faturamento anual superior a US$ 184 bilhões, Yhebert Gouveia, vice-presidente de operações e conformidade da Abiquim, detalhou que o desafio para este setor é o alto custo energético com o Brasil pagando US$ 12 por MBTU (milhões de BTUs) contra US$ 1,26 por MBTU, o que acontece por não usar gás de xisto.
Gouveia também endossou a fala no começo do evento de Ricardo Capelli, presidente da ABDI, que afirmou ser necessário criar uma política de estado para a indústria. Em sua visão, o representante da indústria química acredita que o Brasil não suporta mais “voos de galinha” no setor.
Reforçou ainda a dificuldade dos outros em encontrar mão de obra qualificada e a capacidade do país e das indústrias reterem talentos: “Os últimos prêmios Nobel de química tinham brasileiros, mas eles estavam assinando em times estrangeiros”, disse.
“Nós patrocinamos a Olimpíada Internacional da Química, junto com a Sociedade Brasileira de Química. Dos 200 finalistas, 62 eram brasileiros, de Fortaleza. Quando são olímpicos, são medalhistas e, evidentemente, vão embora”, completou ao explicar o brain drain que passa com o Brasil perdendo seus principais pensadores.
Peças automotivas
Para Maurício Muramoto, diretor de inovação na Sindipeças, a falta de mão de obra acontece principalmente pela concorrência da indústria com o segmento financeiro e até com a criação de conteúdo, pois muito estudantes saem do ensino superior para serem influenciadores digitais.
Muramoto indicou ainda que a associação com 500 participantes analisa que o setor está pressionado por novas tendências (vide carros elétricos) e rivais mais rápidos da China. Para efeito de comparação, o executivo revelou que os chineses produzem, em média, 30 milhões de veículos por ano contra 2,6 milhões de brasileiros, o que dificulta a competição e a amortização de ferramentas.
“O setor de autopeças brasileiro vive com volumes baixíssimos comparativamente ao chinês. Então, como conseguir competitividade nesse cenário? Lidando com todos os temas que colocamos aqui. Mas acredito que a grande dificuldade é a necessidade de mais competitividade e mais produtividade”, completou.
Imagem principal: representantes da indústria participam de painel sobre gargalos e desafios do setor (crédito: Henrique Medeiros/Mobile Time)
