A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) apresentou no sábado, 13, um ofício ao deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), relator do PL 2630/2020 ou PL das Fake News, sugerindo a criação de um sistema tripartite regulatório para supervisionar a aplicação da lei. Ouvidos por Mobile Time, os especialistas se dividiram entre aqueles que acreditam que a ideia não é boa e que não vai ter aderência entre os parlamentares, e aqueles que acharam a proposta positiva e que pode dar certo.

Para Patrícia Peck, advogada especializada em direito digital e sócia-fundadora do escritório Peck Advogados, a proposta da OAB simplesmente “não cola”. Para a especialista seria “difícil operacionalizar”.

Apesar de concordar com órgão regulador multissetorial, a inserção da própria OAB no sistema tripartite e das agências ANPD e Anatel são difíceis de entender para Flávia Lefèvre, advogada especialista em telecomunicações, direitos do consumidor e digitais. “Concordo que o SBRP [Sistema de Brasileiro de Regulação de Plataformas Tripartite] seja integrado pelo CGI.br, com alguns ajustes no art. 58 proposto, que trata das atribuições do Comitê. Também vejo como relevante a proposta de se criar a Entidade de autorregulação, instituída de acordo com os critérios previstos na lei e reconhecida pelo CPD (Conselho de Políticas Digitais). Não vejo na proposta justificativa plausível para que integrem a estrutura regulatória a Anatel e a ANPD”. Lefèvre também não vê motivos para citar o Cade e não citar a Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor) por ser “também um órgão do MJ [Ministério da Justiça] e tem atribuição legal incontestável para tratar da atuação das plataformas, em virtude de que a relação que mantemos com essas empresas é de consumo, como já decidiu o STJ”, escreveu no Twitter nesta segunda-feira, 15.

A advogada critica mais uma vez a citação da Anatel como entidade regulatória e relembra que as “agências reguladoras têm se mostrado ineficientes, como aponta frequentemente o TCU. Veja-se os graves problemas que os cidadãos/consumidores dos serviços de telecomunicações, energia elétrica, gás, e saúde, por exemplo, vêm amargando pela atuação cooptada da Anatel, Aneel e ANS”, escreveu.

Há também quem elogie a sugestão da OAB. É o caso, por exemplo, do advogado Rafael Pellon: “A sugestão é interessante ao propor uma multissetorialidade que traria maior representatividade ao debate sobre práticas e regulação das redes, ainda que não detalhe muito quais os papéis de cada um dos órgãos propostos e como estes interagiriam entre si”, diz.

“É interessante notar também que a proposta fala em termos representantes dos Poderes da República, inclusive o Judiciário, mas não detalha se as decisões tomadas por este órgão de alguma forma seriam acolhidas como definitivas, o que geralmente não é possível, haja vista o direito constitucional de acesso ao Judiciário, o que arriscaria a criação de conselhos e órgãos que ainda teriam que enfrentar o crivo deste Poder em suas decisões. Os órgãos seriam muito bem-vindos se pudessem trabalhar na criação de diretrizes, procedimentos e fluxos de trabalho que equilibrem as práticas atuais das redes e plataformas de aplicações de Internet com a jurisprudência e legislação mais atuais do país no tocante à vida digital”, completa.

Ao contrário de Peck, para Christian Perrone, a proposta da OAB pode “angariar suporte” no Congresso. “Acredito que avança em muitos pontos com uma proposta que pode servir como uma alternativa viável para a situação que estão debatendo. Acho particularmente positiva a estrutura do conselho com uma visão ampla. Interessante que exista uma abertura para os diferentes setores”, completa.

Entenda

A OAB propõe a criação de um Conselho de Políticas Digitais (CDP) que seria responsável por analisar os relatórios de riscos sistêmicos e de transparência publicados pelas big techs.

Para a OAB, não seria possível um órgão, setor ou agente único desempenhar tal função. Por isso, defende a criação de um Sistema Brasileiro de Regulação de Plataformas Digitais tripartite.

Ele seria dividido da seguinte forma:

– Conselho de Políticas Digitais: órgão responsável pela fiscalização e aplicação da regulação composto por representantes de representantes dos três poderes, mas também de ANPD, OAB, Cade e Anatel;

– Comitê Gestor da Internet no Brasil: responsável por promover debates, estudos e diretrizes sobre o tema;

– Entidade de autorregulação: entidade privada para deliberar sobre casos concretos de moderação de conteúdos das plataformas digitais.