| Publicada originalmente no Teletime | Além das recomendações de avanços regulatórios para telecomunicações e radiodifusão, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgou nesta segunda-feira, 26, um segundo relatório específico sobre a economia digital no Brasil (clique aqui para acessar). Entre as recomendações fundamentais está a melhoria na confiança para a economia digital. Para tanto, diz que o País deveria garantir a total independência da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). E isso seria possível não apenas com uma composição orçamentária adequada, mas também garantia de uma diretoria independente.

Conforme expôs durante evento online o diretor de ciência, tecnologia e inovação da OCDE, Andrew Wyckoff, o Brasil está no caminho correto com a implantação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). “Mas fizemos recomendações adicionais”, declarou. Entre elas, a de que o governo “garanta a nomeação da diretoria da ANPD e do Conselho Nacional para a Proteção de Dados Pessoais de forma transparente, justa e baseada em expertise técnica”.

Não se trata de um mero detalhe de recomendação de melhores práticas de governança, mas de uma crítica específica ao artigo 55-A da LGPD, que estabelece a estrutura da Autoridade, bem como a nomeação da diretoria. Na apresentação do relatório, Wyckoff destacou a necessidade de independência como principais fatores para a garantia dessa confiança digital.

No entanto, ressalta a entidade, a Autoridade está “fortemente vinculada ao executivo”, uma vez que os membros foram indicados pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, e não pelo conselho diretor. Segundo o documento da OCDE, a ANPD “foi estabelecida não para conceder qualquer status especial à autoridade em questão ou seus agentes, mas para reforçar a proteção aos indivíduos, e aos órgãos afetados por suas decisões. Por conseguinte, a ANPD deve agir de maneira objetiva e imparcial no exercício de suas funções. Para atender esse propósito, a ANPD precisa continuar livre de qualquer influência interna ou externa”.

Além disso, a organização cita que a LGPD não estabelece como o conselho diretor da autoridade vai implementar as decisões e recomendações dos órgãos, ou como as entidades vão administrar as divergências que eventualmente surgirem. O documento também coloca que é necessário garantir um orçamento “adequado e previsível” por meio de um processo transparente.

Durante a coletiva de imprensa promovida no Itamaraty, o governo brasileiro não citou esse ponto do relatório, preferindo sempre ressaltar o que a organização destacou positivamente. Vale lembrar que Bolsonaro nomeou no dia 14 deste mês uma diretoria composta por três militares com longos mandatos, e apenas duas civis, mas com mandatos reduzidos. A forte presença militar foi criticada por entidades representantes da sociedade civil.

Recomendações

Conforme o relatório da economia digital, a OCDE sugere:

  • Reavaliar e revisar as condições estabelecidas nos termos da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) no Artigo 55-A da Lei 13.709, a fim de garantir que a Autoridade opere com total independência desde o início de seu estabelecimento. 
  • Garantir que as regras para a indicação do Conselho Diretor da ANPD e do Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade (CNPDP), sejam transparentes, imparciais e baseadas em conhecimento técnico. 
  • Esclarecer as responsabilidades e tarefas do CNPDP. 
  • Estabelecer regras claras em relação à tomada de decisões no âmbito da ANPD, e à sua implementação pelo Conselho Diretor. 
  • Garantir ou adequar um orçamento previsível para a ANPD, por meio de um processo transparente. 
  • Alinhar a Estratégia Brasileira para Inteligência Artificial com a Lei Geral de Proteção de Dados, e outros marcos legais relevantes em cooperação com todos os atores. 

GSI

A estrutura da implantação da Estratégia Nacional de Segurança Cibernética no governo também é comentada no relatório. A OCDE nota que o departamento de Segurança da Informação do GSI responde ao mesmo ministro que a Abin. Para a entidade, o governo deveria direcionar mais recursos para a área, uma vez que ela vai coordenar a Estratégia.

Coloca que, “embora tenham por objetivo criar confiança, as medidas de segurança digital também podem minar a confiança, por levantar suspeitas em relação aos direitos humanos ou aos valores fundamentais, especialmente a privacidade. A segurança digital e a proteção da privacidade podem reforçar ou minar uma à outra, dependendo de como são geridas. É essencial, portanto, que a segurança digital e a proteção da privacidade sejam tratadas de uma maneira consistente, inclusive do ponto de vista jurídico e ético”.